domingo, 21 de junho de 2015

Coragem

Desde adolescente sempre tive dificuldade no convívio social. Não porque não me adaptasse ou não conseguisse me relacionar com as pessoas, muito pelo contrário. Sempre tive bastante amigos, bom relacionamento com todos, sem muitos conflitos. Mas eu era muito tímida, e sempre achei muito difícil colocar limites nas pessoas. Além disso, também tinha uma sensação de que não pertencia a lugar nenhum, que não era aceita ou nunca agradava ninguém. Por isso, minha tendência, principalmente durante  minha adolescência, foi de isolamento, e faltava-me coragem para enfrentar essa dificuldade.
Sempre gostei de estar no meu quarto, ouvindo minhas músicas, lendo meus livros, vendo filmes, todas minhas diversões prediletas. Convivia com os amigos e família, mas o momento em que eu me sentia bem, livre de toda a pressão social, era quando eu estava sozinha, quieta, sem precisar ser ninguém mais, sem precisar ficar com medo de não agradar. Enfim, estar com as pessoas era ver nos outros o que eu pensava de mim mesma. Os outros apenas refletiam o que eu pensava de mim, por isso era tão difícil essa convivência.
Os anos se passaram, a vida adulta chegou, e fui “forçada” a assumir uma postura na qual não mostrasse muito essas minhas fragilidades e dificuldades sociais. Uma das técnicas que usei para vencer a timidez e o constrangimento na frente das pessoas era o bom humor, rir de mim mesma, escondendo assim, toda a vontade que na verdade eu tinha de não estar naquela interação. Mas o interessante é que, apesar de me sentir muito mais aliviada sozinha, isso não me completava. No fundo me sentia mal por não ter a capacidade de ficar bem diante das outras pessoas, porque eu gostava de estar com elas, o problema era como eu me sentia em relação a elas.
O primeiro grande desafio que eu me coloquei foi quando, na época do mestrado, um amigo pediu que eu recebesse uma amiga dele na minha casa por um tempo. Ela havia passado no mesmo programa de mestrado que o meu, e não tinha onde morar, pois era de outro Estado. Obviamente eu morava sozinha, e receber uma pessoa que eu não conhecia para morar comigo era impensável. Lembro que sofri por uma semana para dar a resposta, porque não queria que meu amigo ficasse chateado comigo, além de na verdade não ter nenhuma desculpa para não aceitar que ela ficasse na minha casa.
Acabei aceitando porque sabia que era o certo a fazer, eu sabia que devia ajudar a menina que vinha de tão longe. Assim, quando ela chegou, disse logo que para mim era difícil ter uma pessoa em casa, e que ela poderia ficar ali enquanto não encontrasse um lugar para ficar. Fiquei contando os dias para que ela arranjasse algum lugar, para que eu voltasse a minha vida normal sem ter que interagir com ninguém quando chegasse em casa. No entanto, esse teste forçado ao qual me coloquei, de aceitar alguém morando comigo, me proporcionou uma das maiores mudanças e aprendizados da minha vida, pois essa menina acabou se tornando uma das minhas melhores amigas, e me mostrou que eu não era tão difícil assim de conviver. Ela entendeu e respeitou minha dificuldade, e ainda por cima mudou minha forma de ver muitas coisas.  Dividimos apartamento por quatro anos, num convívio perfeito. Com essa amiga pude ser eu mesma, e para minha surpresa, continuamos sendo amigas depois disso e por causa disso.

Pode parecer simples para alguém que vê de fora, mas essa decisão foi um ato de coragem de enfrentar algo que me incomodava muito. Essa exposição à uma situação tão desagradável para mim, me fez enxergar muitas coisas que eu não percebia, mesmo com muitos sofrimentos nesse processo. Mas no final superei boa parte daquilo que me incomodava graças à coragem de enfrentar esse problema. Ainda hoje tenho um pouco dessa dificuldade, mas diferente de outras épocas, sei que posso enfrentá-las e superá-las. E principalmente, que a melhor forma de conseguir isso é através do convivío com o outro.

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