Essa é a história de uma menina e seu pai. Vou contar
essa história porque acompanhei o seu desenrolar durante toda minha vida, e
assim, com a autorização da protagonista, sinto-me à vontade para
compartilhá-la.
A relação dessa menina, Laura, com seu pai, nunca foi
uma relação que se espera entre um pai e uma filha. Seus pais se separaram
quando ela tinha apenas um ano de idade. Não foi uma separação amigável, e
ficaram muitas mágoas e ressentimentos entre essas duas pessoas. O pai saiu de
casa e construiu uma nova família. Laura nunca viu os pais juntos, em nenhuma
ocasião, e de certa forma, a ausência desse pai foi algo comum para ela desde
pequena. Além dessa ausência, Laura cresceu com a presença de uma frase que
ouviu desde pequena, mas que não foi escutada diretamente através de seu pai. Ele havia
dito certa vez que ela não era sua filha, logo no momento da separação. E de
fato, por algum motivo, foi assim que, Laura e seu pai, conviveram durante
anos, como se nada fossem.
Laura tinha muito claro que não sofria com a suposta rejeição
do pai, mas sim, pelo seu irmão que tanto desejava a admiração e atenção dele.
Mas ela, não. A vida havia compensado está ausência com dois outros pais, o avô
e o padrasto, que cumpriram muito bem o papel.
No entanto, não poderíamos dizer que essa ausência foi
completa na sua vida. Existiram alguns momentos com seu pai, mas no fundo, Laura
sempre sentia uma frustração no final desses encontros. Nada era dito, ambos
não manifestavam o sentimento de estranheza, falta de afinidade e intimidade
que existia entre eles. E ela retornava para sua casa evitando pensar no
assunto, pois talvez aquela situação pudesse causar muita dor.
Já com 30 anos, na ocasião do seu casamento, à pedido
de sua mãe, telefonou para o seu pai avisando que iría se casar. Sería apenas
um jantar, um casamento no cartório, para oficializar um relacionamento de oito
anos. Mas para Laura não havia sido um convite ao seu pai, apenas um
comunicado.
No dia seguinte, o pai ligou para Laura, e para sua
surpresa desta vez comunicando que estaría presente no casamento. No entanto, mais
surpreendente ainda, foi Laura dizer para seu pai que não gostaría que ele
estivesse presente nesse dia.
Esse “não” na verdade foi um impulso de expressar seus
sentimentos e de “quebrar” aquela farsa
de que tudo estava bem entre eles, uma tentativa de colocar um limite nas ações
de seu pai em relação a ela, para que ele entendesse que as suas atitudes ou a
falta delas haviam causado muita dor. Entretanto, também foi um “não” cheio de
raiva e mágoa carregadas durante anos, e que ela acreditava dizer respeito
apenas ao seu irmão. Mas então, junto com esse limite imposto, com esse pedido de
respeito, ela despejou toda a sua dor de fatos que haviam acontecido durante
sua vida, sem dizer o que realmente estava sentindo, apenas apontando todos os
“erros” dele.
Apesar de ela estar segura da sua atitude ao não
permitir que seu pai fosse ao seu casamento, um mau-estar surgiu em Laura após
este desabafo. O que devería ter sido um momento para mostrar sua dor para o
seu pai, para mostrar o quanto aquela criança havia sido maltratada, as
palavras viraram-se contra ela. A mensagem de dor não alcançou o coração do seu
pai, mas apenas a raiva.
A partir desse dia até hoje eles não se falaram mais. Laura tentou uma reaproximação, mas não obteve um retorno. Ela não sabe por qual
motivo ele cortou definitivamente relações com ela depois desse dia, se pela
mesma raiva que foi proferida contra ele, por vergonha, por indiferença, por mágoa... Ela sabe que finalmente conseguiu expressar algum sentimento, consciente ou
inconsciente, de forma correta ou não. Mas acima de tudo ela percebeu que se
quer mostrar a sua dor ao outro, e se quer ser compreendida, não será através
de acusações que irá conseguir. Ela espera um dia voltar a falar com esse pai,
não na esperança de encontrar um relacionamento de pai e filha, mas para que ambos sigam em
paz os seus caminhos.
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